Aos irmãos e irmãs reunidos no Somos Um (Rio de Janeiro, 6-9 de setembro de 2018), Graça a vós outros, e paz da parte de Deus nosso Pai e de nosso Senhor Jesus Cristo!
Sou de tradição protestante. Mas preciso dos sons dos sinos a me pontuarem o dia, sugerindo-me ao coração o momento de prece; preciso de seu toque cristalino, a me lembrar que a vida não se esgota na imanência, que o Transcendente nos circunda e envolve e que, se olharmos bem, cada arbusto arde com a Presença divina.
Sou de tradição protestante, mas preciso do ano litúrgico, com suas festas a me escandirem o tempo, a assinalarem Advento e Páscoa como duas montanhas altaneiras ao longo do meu ano. Preciso do ano litúrgico com sua sabedoria, a me lembrar que entre os picos dessas duas festas se estende o vale do Tempo Comum, com seus domingos a se sucederem pedindo, a mim, a escuta humilde da Palavra. Preciso do ano litúrgico a me lembrar aue, naquilo que parece sempre constante e igual habita, de fato, o Novo daquele que, na cruz, fez novidade todas as coisas.
Sou de tradição protestante, mas preciso da Eucaristia como centro inspirador e irradiador de minha espiritualidade. Não se compreende a Eucaristia; basta-nos saber que, por trás da iconóstase de mistério que a circunda, nela o Senhor vem até nós e nos alimenta com sua vida. Preciso da Eucaristia, não como apêndice mensal de um culto, não como item a ser “ticado” na agenda eclesial, mas como centro da adoração comunitária: na Mesa, através do partir do pão, nós nos encontramos com o Senhor. “Ele está no meio de nós!”; “E erguendo eles os olhos, a ninguém viram, exceto a Jesus”; “Então seus olhos se abriram e o reconheceram”.
Sou de tradição protestante e estou consciente de que nada do que escrevi aqui trai essa minha tradição. Porque, como protestante, minhas raízes também mergulham naquele passado distante, no Primeiro Milênio de nossa era, na época da Igreja indivisa, a Igreja dos Pais e dos mártires. Essa é também a minha Igreja. Essa é, para além de toda polêmica histórica, também a minha tradição.
Sou de tradição protestante, mas creio com todo o meu coração que em Cristo somos um!
São Paulo, 9 de setembro de 2018 (23o. Domingo do Tempo Comum)